Crise no arroz preocupa produtores gaúchos e mobiliza Assembleia Legislativa

Em entrevista, deputado Marcus Vinícius falou sobre a crise no arroz e os impactos para diversos municípios do Rio Grande do Sul.

AGRICULTURA

Plantão da Lagoa

10/22/20254 min ler

brown wheat in close up photography
brown wheat in close up photography

O Rio Grande do Sul vive um dos momentos mais delicados da história recente da cultura do arroz. O deputado estadual Marcus Vinícius Vieira de Almeida (Progressistas), presidente da Frente Parlamentar do Arroz, afirmou que o setor enfrenta “a pior crise desde o auge da pandemia da Covid-19”.

A queda acentuada nos preços, o aumento dos estoques e a entrada de arroz importado pelo Paraguai têm provocado prejuízos expressivos aos produtores. Em algumas regiões, a saca de 50 quilos é vendida a R$ 56, valor bem abaixo do custo médio de produção, que gira em torno de R$ 63.

O cenário preocupa porque, historicamente, os meses de outubro a dezembro são de maior valorização no mercado. “Durante a pandemia tivemos preço baixo, mas nunca nesta época do ano. Isso não tem precedente”, alertou o parlamentar.

Diante da gravidade da situação, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em conjunto com entidades representativas do setor, iniciou uma série de debates e articulações para buscar medidas emergenciais de alívio ao produtor e alternativas de longo prazo para o equilíbrio da cadeia orizícola.

Entidades e parlamentares unem forças

A mobilização do Parlamento contou com a presença de Federarroz, Sindarroz, Farsul, Fetag, FarSul e do Instituto Rio-Grandense do Arroz (Irga). O grupo se reuniu em uma audiência de trabalho em 13 de outubro, em Porto Alegre, para discutir soluções imediatas.

Segundo Marcus Vinícius, o encontro reuniu representantes de seis bancadas partidárias e 31 deputados. “A reunião começou como um encontro técnico, mas se transformou em uma verdadeira audiência pública. Foi um momento de desabafo e união em torno de um problema que atinge toda a Metade Sul”, destacou.

As entidades apontaram duas medidas prioritárias para atenuar os efeitos da crise: a isenção temporária da Taxa CDO (Contribuição de Defesa da Orizicultura) e a redução do ICMS sobre o arroz, seguindo o modelo já adotado pelo estado do Paraná.

“A isenção da CDO, ainda que temporária, pode dar fôlego para exportar com mais competitividade. Um ganho de 1,5% na exportação representa muito dinheiro para o produtor”, explicou o deputado.

Estoques elevados e importação pressionam o mercado

De acordo com Marcus Vinícius, a política de estoques do governo federal contribuiu para a desvalorização. “O governo comprou grandes volumes de arroz para baixar o preço ao consumidor e acabou baixando também o preço para o produtor”, afirmou.

Além disso, o deputado apontou o excesso de arroz importado do Paraguai como um dos principais fatores da crise. “Minas Gerais já tem mais de 70 indústrias que compram praticamente só arroz paraguaio, de qualidade inferior, mas beneficiado lá e vendido aqui com isenção tributária”, denunciou.

A política de livre comércio no âmbito do Mercosul permite a entrada do produto estrangeiro com tarifa zero, o que gera desequilíbrio de preços e prejudica a competitividade do arroz gaúcho. “Essa prática cria uma vantagem indevida e ameaça a indústria local”, alertou Marcus Vinícius.

Produtores avaliam reduzir o plantio

O custo de produção elevado e o preço baixo desmotivam o plantio da nova safra. Em regiões como Uruguaiana e Alegrete, onde os custos logísticos são maiores, o prejuízo é ainda mais expressivo.

“Há produtores que já avaliam não plantar. É difícil investir sabendo que vai somar prejuízo”, destacou o deputado. Ele lembrou que converter áreas de banhado em pastagem ou soja não é uma alternativa viável de curto prazo. “Essas áreas exigem tempo e investimento para adaptação. Não se muda de cultura do dia para a noite”, explicou.

Segundo dados do Irga, a área plantada em outubro está 30% abaixo do normal, reflexo direto da falta de recursos e da baixa confiança dos produtores.

Projetos devem ser votados ainda em 2025

Marcus Vinícius afirmou que as propostas de isenção da CDO e redução do ICMS devem ser encaminhadas à Assembleia Legislativa até o fim do ano.

“As medidas não resolvem o problema, mas ajudam a reduzir os prejuízos. Precisamos aprovar tudo até 31 de dezembro, porque no próximo ano, sendo eleitoral, o governo não pode conceder renúncia fiscal”, explicou.

Ele destacou que a unidade política é essencial para aprovar as medidas em tempo hábil. “Se conseguirmos reduzir os custos e estimular a exportação, esvaziaremos os estoques e poderemos reequilibrar os preços até o próximo ciclo de plantio”, disse.

Diversificação e inovação no horizonte

Além das ações emergenciais, o deputado defende inovação e diversificação como caminhos para fortalecer a cadeia orizícola. Segundo ele, o arroz pode ganhar novos mercados ao ser transformado em etanol, proteína vegetal, cosméticos e farinha especial.

“Temos que olhar para frente. O arroz é uma matéria-prima nobre e versátil. Pode ser base de combustíveis, alimentos e cosméticos”, afirmou. Ele lembrou que Santiago, Júlio de Castilhos e Passo Fundo já desenvolvem projetos de etanol de milho e que o arroz pode seguir o mesmo caminho.

Marcus Vinícius também sugeriu ampliar o estudo de novos cultivares, como o arroz japonês, negro e vermelho, que têm maior valor agregado e podem conquistar nichos de mercado. “Precisamos pensar em produtos diferenciados que gerem renda e agreguem valor ao nosso arroz”, pontuou.

O deputado destacou ainda as mudanças nos hábitos alimentares da população, que impactam diretamente o consumo do cereal. “As pessoas estão comendo menos em casa e mudando a rotina alimentar. Isso reduz o consumo de arroz e feijão”, observou.

Ele citou que restaurantes e buffets priorizam saladas, frutas e proteínas, o que diminui o espaço do arroz no prato do brasileiro. “Há uma tendência de redução do consumo de carboidratos quentes. O setor precisa se adaptar e inovar”, completou.

Um alerta para a economia

Marcus Vinícius lembrou que a crise do arroz ultrapassa o campo e afeta diretamente o comércio e os serviços nas cidades do interior.

“Sem o arroz e sem o fumo, a região da Costa Doce não existiria economicamente. É o produtor que movimenta o comércio e faz a vida acontecer nas cidades”, afirmou.

Ele defendeu que o governo estadual mantenha diálogo constante com as entidades do setor e invista em estratégias de exportação e valorização do arroz gaúcho. “A crise é séria, mas também é um momento de reflexão e reinvenção. Precisamos olhar para o futuro com inovação e coragem”, concluiu.